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Investigação da cadeia produtiva do óleo de palma

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Ingrediente essencial na culinária afro-brasileira, o óleo de palma (azeite de dendê) é o óleo vegetal mais produzido, comercializado e consumido no mundo. Enquanto insumo industrial, está presente em metade dos produtos vendidos nos supermercados. O óleo é utilizado por multinacionais de alimentos, produtos de higiene e limpeza, cosméticos e biodiesel.

Grandes marcas se beneficiam de violações de direitos humanos na base da cadeia produtiva para adquirir o produto a baixo custo. Pequenos agricultores são explorados por agroindústrias, que estabelecem contratos desleais de fornecimento e arrendamento. Além de arcar com os prejuízos da atividade, eles são submetidos a jornadas exaustivas, terceirização ilegal e atrasos nos pagamentos.

No Brasil, o Pará lidera a produção e detém a maior parte da área destinada à colheita dos cachos de palma. A atividade representa mais de um terço do mercado de trabalho formal nos municípios de Acará, Bonito, Concórdia do Pará, Moju, Tomé Açu e Tailândia.

Para garantir seu sustento, famílias levam crianças e adolescentes para o cultivo e colheita do dendê. Faltam condições básicas de moradia, transporte, saneamento, alimentação, saúde e segurança.

Desde 2020, a maior produtora da América Latina é a brasileira Brasil BioFuels (BBF), de biocombustíveis. A empresa é acusada de promover, por meios violentos, a expulsão de indígenas e quilombolas de seus territórios, além de contaminar as águas que abastecem milhares de famílias paraenses.

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Principais regiões produtoras investigadas pela Papel Social

Também chamado de azeite de dendê, o óleo extraído da palma é o mais consumido do mundo e está presente em metade das mercadorias vendidas nos supermercados. Grandes marcas se beneficiam de violações de direitos na base da cadeia para adquirir o insumo a baixo custo. Agroindústrias impõem condições desleais a pequenos agricultores, que se submetem a jornadas exaustivas e atrasos nos pagamentos.

Em 2018, a Papel Social realizou um amplo diagnóstico da cadeia do óleo de palma no estado do Pará, com base em visitas aos principais municípios produtores, entrevistas, coleta de dados e revisão bibliográfica.

O estudo deu origem ao relatório “Cadeia Produtiva do Óleo de Palma - Avanços e desafios rumo à promoção do trabalho decente: análise situacional”, publicado em 2020 em parceria com a OIT e o MPT. A publicação e um documentário compõem o projeto “Promoção e Implementação dos Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho no Brasil”.

Nossa equipe encontrou situações de trabalho infantil e diversas irregularidades trabalhistas no cultivo da palma. O estudo analisa as condições de trabalho e apresenta um histórico de autuações e resgates envolvendo agroindústrias no Pará. Por meio de um mapeamento completo da cadeia produtiva, foi possível identificar conexões com multinacionais de diversos setores.

Avanço do monocultivo de palma provoca violência contra povos indígenas e quilombolas, grilagem, contaminação por agrotóxicos e desmatamento ilegal. (Foto: Vitor Shimomura)

Além da baixa renda e da precariedade do trabalho, agricultores são explorados pelas agroindústrias através de contratos de fornecimento e arrendamento que violam o Estatuto da Terra. (Foto: Vitor Shimomura)

Colheita dos cachos de palma envolve irregularidades trabalhistas, condições degradantes, terceirização ilegal e violações de direitos humanos. (Foto: Vitor Shimomura)

Pará é o maior produtor do óleo de palma no Brasil, e as agroindústrias detém cerca de 90% das áreas de produção no estado. (Foto: Vitor Shimomura)

Trabalho infantil é frequente nos dendezeiros, principalmente devido à falta de capacidade econômica dos agricultores familiares. (Foto: Vitor Shimomura)

Principais municípios produtores possuem baixos índices de desenvolvimento humano. As famílias carecem de condições básicas de moradia, saneamento, alimentação e saúde. (Foto: Vitor Shimomura)

Óleo de palma é amplamente utilizado nas indústrias e está presente em metade dos produtos dos supermercados, como alimentos, cosméticos e produtos de higiene e limpeza. (Foto: Vitor Shimomura)

Da etapa do cultivo e colheita, onde se concentram as violações de direitos, os cachos de palma seguem para usinas extratoras e refinarias, e o óleo é comercializado por grandes agroindústrias, como BBF e Agropalma. (Foto: Vitor Shimomura)

A partir do estudo da Papel Social, o MPT desenvolveu ações para a promoção do trabalho decente na cadeia da palma, com a criação de um grupo de trabalho, inspeções em propriedades rurais e instauração de um inquérito civil

Nativa da Costa Oeste africana, a palma de óleo ou dendezeiro dá origem a dois tipos de óleo: o de palma e o de palmiste, extraídos da polpa do fruto e da amêndoa, respectivamente. Essa espécie de palmeira chegou ao Brasil nos navios negreiros do século XVI, com mudas trazidas por africanos escravizados.

O cultivo industrial começou nos anos 1970 e teve grande expansão a partir de 2010, com diversos incentivos do Governo Federal.

A extração do óleo de palma se concentra em poucas empresas agroindustriais, todas associadas a violações de direitos humanos na base da cadeia. Além da BBF (antiga Biopalma), as mais relevantes são a brasileira Agropalma (Conglomerado Alfa) e a estadunidense Archer Daniels Midland (ADM).

As agroindústrias controlam cerca de 90% das áreas de produção do Pará. O restante se divide entre pequenos e médios produtores, agricultores familiares e assentados da reforma agrária. Estes arrendam suas terras e fornecem a palma com exclusividade para as indústrias, por meio de contratos de “parceria”. O vínculo é necessário para que os agricultores tenham acesso a financiamentos de bancos públicos em projetos de fomento ao setor.

Com vigência de 10 a 25 anos, os contratos permitem que as empresas apliquem descontos ou não adquiram toda a produção, caso esta não atenda a seus critérios de qualidade. Os agricultores ficam vulneráveis a falhas operacionais das empresas e à ocorrência de pragas ou intempéries.

Esse desequilíbrio contratual configura uma violação ao Estatuto da Terra. Segundo a definição de parceria agrária, os atores envolvidos devem partilhar dos lucros e dos prejuízos da atividade. O trabalhador deveria ter autonomia na escolha do plantio, das técnicas empregadas e de compradores para sua produção.

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Fluxograma da produção de óleo de palma

O primeiro elo da cadeia da palma são os fornecedores de sementes, mudas, fertilizantes, defensivos agrícolas, combustíveis, máquinas e equipamentos.

No cultivo e colheita do dendê estão as violações de direitos mais graves. Trabalhadores informais são pagos por diária para fazer a poda, cortar e carregar os cachos de palma, principalmente em propriedades familiares.

Os cachos seguem para as usinas extratoras e refinarias. As agroindústrias comercializam o óleo de palma bruto ou refinado no mercado nacional e externo.

São variadas as aplicações industriais do óleo de palma. As indústrias compradoras produzem pães, biscoitos, margarina, sabões, sabonetes, detergentes, fármacos, biodiesel, dentre outros.

Quase toda a produção brasileira é destinada à indústria alimentícia. A maioria das empresas compradoras, como a suíça Nestlé, não possui mecanismos eficazes de monitoramento para prevenir riscos ambientais e sociais.

Informações-chave

Contratos entre agroindústrias e agricultores são frágeis e pouco transparentes. Eles estabelecem uma relação de subordinação estrutural e violam o Estatuto da Terra. Os trabalhadores são prejudicados por cláusulas abusivas, perdem autonomia na gestão de suas propriedades e assumem integralmente os riscos do negócio.

Os principais municípios produtores no Pará apresentam baixos índices de desenvolvimento. As taxas de analfabetismo e trabalho infantil são superiores à media estadual e nacional. A renda obtida com o dendê é insuficiente, e são recorrentes os casos de endividamento de agricultores com empresas e bancos públicos.

As condições de trabalho são absolutamente precárias. Agricultores carecem de locais adequados para refeição, banheiros, água potável e equipamentos de proteção individual, tornando-se vulneráveis a acidentes e ataques de animais peçonhentos.

Mulheres costumam recolher os cocos de palma que ficam para trás no carregamento, e nem sempre são remuneradas. Também é frequente o trabalho de crianças e adolescentes nessa tarefa, como forma de ajudar na renda familiar.

A terceirização da atividade-fim é generalizada entre as agroindústrias. Grandes empresas já foram autuadas por terceirização irregular e submissão dos trabalhadores a condições degradantes.

A Papel Social produziu, em 2021, um relatório para a Oxfam Brasil sobre violações de direitos de povos tradicionais, conflitos de terra e o avanço do monocultivo da palma no Pará. O documento aborda a ocupação de terras indígenas e quilombolas para a produção de dendê por grandes indústrias do setor, levando a prisões e assassinatos de lideranças, violência contra as comunidades, expulsão de famílias, contaminação por agrotóxicos, desmatamento ilegal e desequilíbrios ecológicos.

Desde aquele ano, o Pará é palco da chamada “guerra do dendê”, marcada pela violência de agroindústrias contra indígenas e quilombolas que denunciam grilagem de terras e violações de direitos humanos na base da cadeia produtiva.

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