O Brasil é o principal exportador de açúcar do mundo. Quase 500 anos após a instalação do primeiro engenho no país, a produção de cana permanece associada a violações de direitos humanos, desmatamento e violência contra povos indígenas.
Durante dois anos, a Papel Social investigou os elos da maior cadeia mundial no setor, liderada pela Coca-Cola. O resultado é o livro “O Sabor do Açúcar: trabalho escravo, desmatamento e violência contra povos indígenas na cadeia produtiva do refrigerante”, lançado em 2022 em parceria com a ONG ACT Promoção da Saúde.
O estudo aborda as relações de poder envolvendo o agronegócio no Brasil e apresenta irregularidades na cadeia de fornecimento de grandes empresas do setor sucroalcooleiro.
Agronegócio e escravidão
A pesquisa revela a conexão entre grandes empresas e trabalho análogo à escravidão, invasão de terras indígenas, grilagem, fraudes tributárias, contaminação por agrotóxicos, desmatamento, queimadas, expulsão de comunidades tradicionais, morte de trabalhadores, ameaças, tortura e violência de gênero.
No topo da cadeia, com relações comerciais com a Coca-Cola, estão os quatro principais operadores globais de commodities agrícolas, conhecidos como grupo ABCD: Archer Daniels Midland (ADM), Bunge, Cargill e Louis Dreyfus Company. O estudo também traça um perfil dos maiores grupos industriais do setor no Brasil: Biosev, Raízen, BP Bunge e Atvos.
Para mapear os danos sociais e ambientais e estabelecer os elos da cadeia do açúcar, a Papel Social baseou-se em pesquisa bibliográfica, levantamento de dados, solicitações via Lei de Acesso à Informação (LAI) e entrevistas com autoridades, pesquisadores e especialistas.
Fluxograma da produção do refrigerante
A cadeia do açúcar começa com o plantio e colheita nos canaviais, etapas em que são mais frequentes as violações de direitos humanos. O trabalho na colheita dura cerca de seis meses e é realizado por trabalhadores safristas ou temporários.
A cana é processada e refinada nas usinas, e o açúcar segue para distribuição e exportação por grandes grupos empresariais. A matéria-prima também pode ser transformada em etanol e em subprodutos alimentícios como melado e cachaça.
Antes de ser adicionado ao refrigerante, o açúcar abastece os fabricantes de xarope, extrato que serve de base para a bebida. O xarope da Coca-Cola no Brasil é produzido na Zona Franca de Manaus (AM) e revendido para engarrafadoras nacionais e de outros países da América Latina.
As fábricas engarrafadoras produzem e embalam refrigerantes e outras bebidas açucaradas, que são distribuídas para supermercados e chegam ao consumidor final.
Principais regiões produtoras investigadas pela Papel Social
O Brasil é o principal exportador de açúcar do mundo. Grandes empresas do setor estão associadas a casos de trabalho escravo, grilagem, fraudes tributárias, desmatamento, expulsão de comunidades tradicionais, ameaça e morte de trabalhadores. Entre os maiores compradores estão indústrias de refrigerante, que não monitoram devidamente seus fornecedores e se beneficiam das violações na base da cadeia.
Informações-chave
Corporações transnacionais se beneficiam de crimes cometidos sistematicamente na base e ao longo da cadeia produtiva. Ocorrências de trabalho escravo, conflitos fundiários e crimes ambientais envolvem as principais fornecedoras da Coca-Cola no Brasil.
As empresas ocultam práticas predatórias na cadeia produtiva do açúcar e impactos negativos causados por suas atividades. A manipulação de dados por meio de lobby e ações de marketing estão entre as estratégias mais utilizadas para difundir uma imagem positiva do agronegócio e distorcer a realidade.
A Coca-Cola e grandes empresas do setor sucroalcooleiro estão envolvidas em dívidas e fraudes tributárias bilionárias. Estima-se que, à época da pesquisa, as indústrias de bebidas adoçadas na Zona Franca de Manaus deixavam de pagar cerca de R$ 3 bilhões anuais em impostos por meio de manobras fiscais.
A indústria estimula o consumo excessivo de açúcar e de ultraprocessados, produtos com aditivos prejudiciais e que provocam ou agravam doenças como obesidade e diabetes. Em articulação com a bancada ruralista, as empresas boicotam iniciativas e políticas públicas voltadas à alimentação saudável, como o Guia Alimentar para a População Brasileira, do Ministério da Saúde.
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